13 marzo 2010

Mentiroso!

Dizes que estás bem, que estás okay, que não há problema. E eu acredito, Ingénua, egocêntrica, não sei, mas acredito.
E agora só me apetece encontrar-te pela rua dar-te um safanão, apertar-te o pescoço e insultar-te da melhor maneira que sei: “Mentiroso!”
E depois iria à televisão, aos programas da tarde, à entrevista com a Júlia Pinheiro. Iria ali, com a minha cara podre e os meus olhos verdes contar-lhes, a eles e a todo o mundo, que um amigo me mentiu e eu, claro, como poderia deixar de ser, apanhei-o numa esquina e pumbas. Espera!, que não me mal interpretem, pumbas de porrada, valente e poderoso enxerto.
- Vi-o na rua e não resisti. A raiva entrou em ebulição e dei-lhe num murro nas trombas, parti-lhe os dentes, e depois esganei-o até que ficasse roxo pela falta de ar.
Tudo isso porque ele me mentiu, repito vezes e vezes sem conta neste meu sonho-delírio.
Depois, claro está, além de ser estrela de tv, seria alvo de investigações policiais e gabinetes de ética. Seria capa de jornais. Foi ou não legitimo o enfardo que deu aquela jovem ao seu amigo mentiroso?
E as pessoas discutiriam o nosso drama nos cafés, nas páginas de sociedade, desse lixo virtual que é a blogosfera.
Até que um dia, numa entrevista em prime time eu desabafaria perante um jornalista desconcertado:
- É que se ele me tivesse dito a verdade, eu pelo menos poderia ter tentado ajudar…
O mundo se emocionaria perante tal sinceridade e eu sairia ilibada de todas as minhas penas.
Agora saltemos todos os passos e que venha o cara-a-cara.

07 marzo 2010

Vida saltimbanca

Mais um dia daqueles. Outro, outra vez, outro. E só ontem me passou pela cabeça que deveria começar a colecciona-los.
Que ideia genial.
Guardaria o adeus numa caixa azul com um grande laço de cetim. Já tenho acumulados tantos, muitos, demasiados. O "eu venho visitar-te" de choro engolido e de choro chorado. O "gosto muito de ti" de abraço apertado que estala os ossos. Aquele "eu ligo-te quando chegar" que leva um olhar e um beijo que jamais esqueceremos. O "até sempre" contado e recontado em noites de ronha debaixo da manta no sofá.
Ficaria rica de tantos "vou ter saudades" e, quando me entregassem um prémio em honra à minha invejável colecção, perguntar-me-iam:
- Como conseguiu chegar a esta quantidade de despedidas?
E então eu diria, orgulhosa:
- É o resultado de uma vida saltimbanca.
Pose. Flash. Troféu na estante.
Parece-me um prémio merecido.

01 marzo 2010

Mais-que-perfeito

Falhara a sintaxe, o verbo e o predicado. Colapsara o sistema das letras racionais. Conjugara os verbos na ultra perfeição de um indicativo do plural.
Buscáramos os beijos que tínhamos programado um dia na nossa agenda rasgada. Tínhamos encontrado o tempo composto. Mas não funcionara. Não fora suficiente e voltáramos ao singular. Fôramos só um, mas devagar, não corrêramos. Não fora preciso, porque já não houvera mais pausas para a publicidade. Agora fôramos só tu e eu num envelope selado no individual. Lágrimas engolidas com um romance de papel.

Desculpara-me se corro, mas nunca me ensinaram a andar. Desculpara-me se fugira ou se misturara flashes de passado com cocktails de álcool. Restos de futuro com chutos de ficção. Desculpara-me se inventara, se criara, se fizera-nos sonhar. Mas tivera a cabeça em blackout. Já não soubera conjugar outro tempo verbal.