08 febrero 2010

O apelo

As minhocas têm nove corações, um para cada dor. O primeiro sofre baixinho, para dentro, com um grunhido interior que cala o som, abafa a voz, põe fita-cola nessa boca tagarela. O segundo é o que ama. O que voa com o silvar do vento, com a banda sonora do primeiro encontro, mas sabe, porque no fundo todos sabemos, que como diria Woody Allen “to love is to suffer, not to love is to suffer, to suffer is to suffer”, e então chora por antecedência o golpe futuro que terá o seu coração.
O terceiro é preguiçoso e sofre por inércia, o quarto deprime-se com a fome do mundo, as mutilações femininas e o tráfego de crianças. Que serio é esse coração. E então chega o quinto, esse histérico. É o que grita, esbofeteia, insulta e berra o mais alto que pode. Eu chamo-lhe coração-revolta, mas isso sou só eu. Ao seu lado está o seis, o cínico. O que põe um sorriso nos lábios engole o choro e segue em frente. O sete sofre por pensar demasiado e o oito sabe que, simplesmente, não pertence a este mundo.
Mas então chega o nono a passos lentos, arrastando os pés. Tem o cabelo despenteado e as olheiras roxas de sono. Ele é macro. Está apenas irritado, desiludido, farto de sofrer nos seus nove corações. Então pega num sapato e mata-se a si mesmo. A si e aos seus oito irmãos. !Suicida!, gritam os seus companheiros, enquanto o resto do reino animal aplaude.
Este é somente um apelo ao suicídio das minhocas. Pela morte limpa e digna. O próximo passo será o massacre.

3 comentarios:

Anónimo dijo...

=)

i dijo...

acho q precisas do contacto de um terapeuta...

Beto dijo...

Num elas são enrugadas, noutro o suicídio. Pobres adubadoras...