01 julio 2010

A vinoteca

Há dias em que acho que vivemos numa bolha. Numa bolha de sabão apertadinha e transparente com reflexos violeta e cheiro a detergente perfumado. E nós ali dentro, sorridentes. O mundo pode cair, o telefone morrer, o relógio espernear. Nós não ouvimos. A nossa bolha é a prova de som.
Só que o calendário passa e com os riscos há sempre um despiste, um pensamento mais profundo, mais racional, mais sei-lá-o-quê. Um algo que, pleft, rebenta o nosso refúgio de passeios e abraços, de conversas na cozinha, de pequenos-almoços com dedos sujos de jornal. Pleft. Vem o mundo e leva-te com ele.
E então fazes-te outro, mais tu, mais o que tu queres ser. Menos eu. Menos nós naquela redoma com gosto de sal. E desse eu não gosto. Tão banal, tão homem moderno, tão centrado no seu mundinho de rotinas tarde-noite, tão pouco aquele eu que um dia encaixou tão bem numa bolha de sabão que voava perdida pela cidade de cristal.
Se calhar isto são só rabugisses de uma sonhadora. Ou, quiçá, visões quadradas de uma velha viciada. Se calhar o melhor seria parar de escrever e ir afogar as minhas mágoas na vinoteca mais próxima. Não sei, diz-me tu.

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