11 mayo 2010

Asas em segunda mão

Atenção, que voar é coisa difícil. Não é como andar de bicicleta sem esfolar-se, alimentar elefantes ou passar vinte horas a viver de uma hormona com nome de remédio. Não podes fazer essas coisas. Chegar aí todo relaxado e sorridente com o teu cabelo despenteado e óculos desalinhados. Aparecer do nada e dizer, desinteressadamente, “vamos aprender a voar”. Voar? Voar é coisa de gente demasiado grande ou demasiado pequena. Voar é coisa de gente demasiado e todos sabemos (e tu sabes) que eu sou normal normalinha e os normalíssimos não voam. Mas pronto, desculpas dadas, já sei que não foi tua intenção causar a discórdia. Nunca é. Quase nunca é.
Mas já que insististes tanto, aprendamos.
Leva-me à feira da ladra e ajuda-me a escolher umas asas em segunda mão. E como poupamos na hélice, o orçamento deve chegar para comprar uma faca, ou similar. Pois cortemos as amarras, desfaçamo-nos de todos os pesos. Esses malditos que dão dores nas costas. Livres e leves, falta encontrar mecanismos de soltura. Sei lá, um pouco de açúcar na veia deve chegar. Busquemos um instrutor e procuremos a rota mais indicada. Não esquecer da banda sonora e da cesta de picnic.
Ate que, um dia, quando tudo estiver a postos, provas feitas, material revisado e exames aprovados. Quando tudo estiver okay, chegará a hora decisiva. O momento, ai esse grande momento, em que o instrutor aproxima-se e grita lá de baixo, com a segurança dos seus pés pisando terra: “Hei menina, atira-se ou não?”.
Já te tinha dito que voar era coisa difícil.

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