22 enero 2007

beira-rio

Sempre conheci bem as margens desse rio. Conhecia a sua manha, o seu ciclo vicioso, o seu olhar diabólico. Sabia que se transbordasse seria difícil conte-lo, sabia que se chovesse ele iria transbordar.
Fiei-me na mão quentinha do amigo, no sorriso sincero de cumplicidade, no abraço reconfortantemente perfumado. Estava em casa, e eu sabia-o. Não faltava ninguém. Resolvi, cegamente, confiar.
Se soltas o rio não podes voltar a prende-lo. A água revolta-se mais a cada minuto e o abraço vai ficando mais apertado e malicioso. Já tenho os cabelos molhados (tira-os da cara, olha-me nos olhos) e as pernas não querem caminhar. Era um jogo de dois contra um. O meu corpo pede para nadar e puxa-me mais e mais para dentro da corrente. A água tampa-me os ouvidos daquela imensidão de confissões que acabaram por se afogar naquele misterioso rio e nadar para não voltar.
Sentia um calor que vinha de dentro, um abraço que apertava e esquentava a noite fria de montanha, sentia vontade e sabia que não, sentia medo e estava incomodamente reconfortada.
Não me quero lembrar daquela montanha, daquele lugar, daquela água.
Mas não te preocupes, não há problema. O rio tem essa capacidade maravilhosa de silenciar os sentimentos e afogar as lembranças.
Já dizia o famoso ditado:
O que acontece à beira-rio, por ali fica e dali não sai.

1 comentario:

Enolough dijo...

A Tide of Thoughts:

http://sureyouwill.blogspot.com/2007/01/same-river.html


beijinhos