Enquanto arrumava os livros no armário e tentava, de modo engenhoso, fazer lugar para mais um volume na minha espaçosa colecção, deixei o pensamento voar em dissertações.
Se um espaço está vazio, significa que “está por preencher”, se a barriga está vazia, significa que “precisa de comer”, se o copo está vazio, significa que “está a espera de ser enchido”, se uma pessoa está vazia, ela tem algum problema.
Criaram-se profissões, cursos, diplomas, especialistas e fizeram-se fortunas à volta do assunto. Os amigos e os familiares foram substituídos por remédios e terapias. Os rituais e gestos formam agora lembranças ineficazes do passado.
Há pessoas que passam pela nossa vida e deixam vácuos, buracos, ausências. Essas pessoas são gentis, carinhosas, divertidas e respiram demais. Elas têm a capacidade de fazer desaparecer o oxigénio. O peito torna-se apertado e passamos a ter dificuldade em respirar, ficamos estupefactos olhando para aquela figura que sufoca a nossa bolha de atmosfera e torna tudo em redor absolutamente abafado. E depois, existem os sanguessugas de oxigénio, passo o erro científico (e viva a liberdade poética). Mesmo quando não estão por perto, estão presentes. Estão ali, na roupa lavada sobre a cama de edredão verde, nos chinelos esquecidos no meio do quarto desarrumado, na lenha que estala na lareira, no barulho que geme do vizinho. Para onde quer que tentemos fugir, lá estão eles, com a sua lealdade; maldita e cúmplice lealdade inabalável.
E os espaços vazios da nossa vida vão aumentando. Vamos dando-lhes nomes e preenchendo-os com palavras e explicações. Vamos mascarando-os com sorrisos e gargalhadas. O vazio é escuro. É preto e profundo.
Ele gosta da noite e do molengar na cama. É companheiro do silêncio e das músicas calmas. Reflecte-se nos olhos e é expelido pelas lágrimas. Dizem que a água limpa o vazio. Eu digo que a água deixa o vazio mais turvo, mais manchado, mais debilitado.
A água mascara a ausência, assim como os novos amigos, um perfume novo, uma boa comida e um telefonema inesperado. Mas a cada momento camuflado, a cada risada forçada, o vazio vai ganhando a batalha e alargando-se, empestando o nosso corpo de espaços despojados de calor e sentimento.
E a cada fechar de olhos, lá esta ele de novo. A tal palavra que escuso de repetir.
Já foi dita e redita 7 vezes neste texto. Não admira que nunca venha a ser uma escritora de verdade. Que falta de imaginação (e diversidade vocabular).
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2 comentarios:
"saudadji" diria o meu amigo holandes
és sim uma escritora de verdade. daquelas que inventa palavras.
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